sábado, 3 de março de 2012

Abditae causae


Dá-me um beijinho, desarruma-me a vida e promete -me o hoje, por favor. Preciso urgentemente do hoje prometido como manda a lei e a sensatez, o de cumprir o que não se fez, o de apagar o choro durante o sono de uma vida. Rasga-me o vestido, a pele, os sonhos. Canta-me uma qualquer cantiga do bandido e relembra-me que estou viva. Os porquê's. Principalmente, preciso de saber os porquês. Porque não me sais. Porque o teu lugar continua intacto e o pó que deixaste me sabe à tua sombra (o que a maior parte dos dias chega, mas todos os dias a menor parte grita mais alto). Porque todos os dias choro com a estúpida falta que me fazes. Porque continuo a fazer-me desentendida e agora, também, freira cega. Terra, contigo.

Eu, onde, quem

Agora é que vai ser. Um a um, todos a sair pela porta fora, com um beijo e uma promessa de me guardarem bonita dentro de vós. Mas vocês, todos lá para fora, que o corpo é meu e é tempo de ser meu, enquanto é corpo que se sinta. Podem esmurrar-me, tentar fazer-me ver que sem vós eu não sou nada, mas alguma coisa eu hei-de ser. Mesmo que não goste. Mesmo que ninguém goste. Mesmo que vos dê um gostinho maldoso de Nós ficamos a ver-te ir, não somos nós que vamos. Mesmo que eu me encontre já morta, cadáver desde nado vivo.

Confesso, o amor que vos tenho anulou-me. É triste para o meu ego, mas é mais triste para tudo o resto que eu queria ser. Já nem as pernas de bailarina, já nem o irmão gémeo perdido, já nem as palavras e a aptidão e a falsa modéstia tenho como minhas. Agora não sei o que vai ser de mim.



Vá, um a um a ir, sem bilhetes de despedida ou momentos para dentro do que dói. Desta vez, eu escolho ficar só e ser só uma. Ver com os meus olhos, descobrir os meus olhos, ver tudo o que está para além do reflexo. A vós, a luz. A mim, a chama. E todos, curados, no seu hospital particular, a lembrarmo-nos que já fomos muitos, já fomos muito uns para os outros. Mas para nós não fomos grande coisa. Nós somos luz. Eu sou luz. Podem apagar os candelabros.