terça-feira, 29 de maio de 2012

Porque sim


Faz três dias mais algum tempo que não me falas. Que te esqueceste. Não é bem de mim, esqueceste-te simplesmente. E eu ia adorar dizer-te que preciso de ti como de trigo para a vida, como batom para o cieiro e de luz para as molduras. Ia adorar pegar em ti sem pudor possível e dizer-te que eu sou faminta de afectos, que nunca quis estar só e que se estou só, é porque já não sei estar de outra maneira. Iria, com certeza, dizer-te para te chegares a mim, estenderes os braços em frente e eu com a minha mão a circunvalar o braço esquerdo, o direito, Deixa-me entrar,  Dás-me um abraço?, morro feliz.

Não te julgo, minha irmã. Eu esqueço-me tanta vez. Não é de ti, esqueço-me. Não sei bem de quê. Provavelmente, de ligar a dizer que gostei de estar contigo, que me deste mais uns centímetros sem os saltos altos precisos. Provavelmente, de rir mais contigo, de ser mais criança no que é preciso. De ser mais crescida quando precisas de um adulto para te endireitar o caminho. De ser a luz que dorme no canto da tua pálpebra esquerda e que te faz sorrir, quando dormes. Esqueço-me, não faço por mal.

Admiro-me ainda que haja tanto rancor, entre nós. É que eu já nos tinha perdoado e não entendo a dor renascida que o músculo sente, por mais que digam que ele não dói. Uma porra, que dói e tira a vida. Quando tento dizer-te que os meus pés estão cansados, enrugados sem causa, cheios de desvios da menina que eu era para ser, a língua prende-se, gaguejo, praguejo e nunca mais acabo uma frase como deve ser. Que estranho sermos de tão perto e termos tanta areia a separar-nos, digo-me. Adormeço.

Depois, em breves segundos, lembro-me, claro como água: esquecemo-nos de alimentar o que nos fazia felizes, únicas, inseparáveis. Veio o mundo e soprou. Nós, palha, cada uma para seu lado- Nunca mais confiar em quem nos olha nos olhos e nos diz que nos Ama. Vou estar aqui sempre, És a pessoa mais importante da minha vida.

- Já não me apetece brincar mais contigo.
- Porquê?
- Porque sim.

Os teus abraços em vapor e eu, estatelada, de queixo no chão.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

O mal sou eu

Não há palavras que descrevam a falta que me fazes. Não há alguém que entenda. Eu não entendo, mas nem por isso me dói menos.

Porque me parece que todos vêem e vão e acenam e sorriem e abraçam e julgam e partem, entretidos na tela das suas vidas. Porque sei que as minhas canelas são fracas de amores de mim para o mundo e do mundo para mim. Porque penso como serei uma outra vez, cuspida da espiral umbilical. Outra oportunidade. Começar sem cabelos brancos nem dedos encarquilhados. Contigo, para sempre. Foi sempre assim que sonhei.

Na verdade o mal nem está na verdade que vivo. Eu queria sempre algo diferente do que tenho e isso faz-me prever o desfecho disto tudo. Não me engano, o amor é uma mistura de dependência, amizade e sexo. Tudo o resto é uma ilusão de poetas e sábios, que vêem muito mais do que eu. Graças a Deus.



domingo, 6 de maio de 2012

Sonho bom



Tu chegas, sentas-me ao pé de mim, olhas-me pelo canto mais bonito da tua infalível máquina de raios x. Finjo que não vejo, não vejo mesmo. Estou adormecida, perdoa-me. Tu até chegas o teu mindinho ao meu como quem diz Cheguei, estou ao pé de ti enfim, enfim sós. Eu nada vejo, cega da pior espécie. Adormeci tanto, formatei tanto a minha forma. Sou disforme e tu, perfeito. Tu chegas e partes, eu fico. Eu saio do que quero ser para sempre.

Tu danças e devolves-me parte de mim à parte minha que ficou. Sou confusa, nervosa, não sei voar. Adormeci, perdoa-me. Sinto raiva- do mundo, de ti, da minha porca memória, das lembranças que doem porque perfeitas e hoje, restos.

Tu tens mãos que me apertam, quando eu ameaço perder o balanço. Tu tens olhos acordados, que me dizem Olá, Amo-te, enfim sós. Eu continuo adormecida, saio para sempre do que me prometes. Escrevo para ti, por saber breve o nosso encontro, por reconhecer que até dele me posso esquecer, dada a memória de peixe e a tendência para a confusão, o nervosismo, a falta de lucidez. Tu ainda me abraças e entregas-te todo e meio, para ficares para sempre entranhado no meu  pedaço vivo. E sorris e eu caio e saio, antes que tarde ou cedo demais.

Sem nome.